O que deixar e o que desejar
Primeira Epístola
Universal de Pedro
O Crescimento na
Palavra
Deixando, pois, toda a malícia… Desejai… para que…
vades crescendo.
I Pedro 2:1-3
Introdução
Entramos agora na terceira parte da terceira seção de I Pedro que vai de 1:12-2:10.
O Apóstolo Pedro continua a
mostrar àqueles grupos de cristãos o que implica o seu novo estatuto, o
resultado da sua fé em Jesus: crescer espiritualmente na Palavra do Senhor.
O que exige de nós a nossa salvação? A resposta começou a ser dada já nos vs.15 e 16: Santidade de vida.
Não é opcional, faz parte da nossa salvação. Somos filhos de um Deus Santo,
recebemos uma nova natureza quando o Senhor nos fez filhos d’Ele pela nossa fé
em Jesus. Por isso, outro resultado da nossa fé no Salvador Jesus é o novo
nascimento, nascemos de novo pela palavra de Deus (v.23). É
precisamente debaixo desta verdade, deste pensamento do novo nascimento que
Pedro prossegue agora a sua exortação e que vem a seguir.
Qual é o nome que se
dá a alguém que nasce hoje? É um bebé.
Ora, esta é a figura do cristão.
Os cristãos, nascidos de novo, são agora como bebés, como meninos novamente nascidos. Precisam
de se desenvolver e de crescer. E o alimento para tal é a Palavra de Deus, é a
própria Palavra pela qual foram gerados.
Esta nova vida que o crente tem é
vivida no mundo, com as pressões e as lutas diárias até que o Senhor Jesus
venha ou nos chame para Ele.
O cristão nascido de novo vive numa
contante luta entre o velho homem e o novo. O novo luta por impor-se e crescer.
O velho é constantemente realimentado pelo mundo ao redor e pelas paixões
interiores até que sejam totalmente transformadas pelo Espírito santo que
habita nele e o santifica.
Como
é que isto se processa na vida do crente, essa pessoa que creu em Jesus Cristo,
essa pessoa que se arrependeu do seu pecado e que nasceu de novo? É uma ação em
duas direções: despojar-se do
antigo e alimentar o novo. Vamos ver o que Pedro diz sobre os aspetos práticos
e da nova vida que cumpre viver aquele que nasceu de novo.
I. O que temos de DEIXAR – “Deixando,
pois…” - v.1 -Não podemos
iludir-nos. Ser crente não é uma brincadeira. É a maior decisão da vida de uma
pessoa. É uma decisão com implicações eternas e imediatas. Ser crente implica
mudanças. Sempre devemos recordar o que Paulo escreve em II Cor.5:17: Assim que, se
alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já passaram, eis que
tudo se fez novo.
O pois, faz a ponte com a seção
anterior e indica a continuidade do pensamento.
O crente tem de deixar. O grego indica: despojar-se,
rejeitar, ou melhor, deixar de lado. É a figura de
“despir roupas sujas, livrar-se de algo”. A ideia de Pedro é que o crente tem
que lidar concretamente e tomar uma atitude em relação ao pecado livrando-se,
afastando-se. E a seguir dá como que uma lista do que deve ser deixado de lado,
uma lista de cinco vícios.
Já que somos de novo gerados, nascidos
de novo, como poderíamos viver naqueles vícios que tipificam a vida antiga?
Esta breve lista será depois aumentada a partir de 2:11ss.
Analisemos a lista dos vícios, as coisas
que têm de ser eliminadas da vida do crente em Jesus.
1.- Toda a Malícia - A primeira coisa a ser eliminada é toda
a malícia. Observem a palavra toda. É mesmo toda e não apenas uma
parte. Indica maldade, depravação, abrange todo o mal do mundo pagão, ímpio.
Deixemos a maldade, livremos o nosso coração e as nossas vidas da malícia.
2.- Todo o Engano - A segunda coisa que tem que ser banida do
crente que nasceu de novo é todo o engano. No grego é “dolo,
ludíbrio, traições”. Engano é falsificar, é o espírito
traiçoeiro que não hesita em usar de meios maus para obter vantagens. É
astúcia, esperteza negativa e destrutiva. Jesus elogiou Natanael porque nele
não havia dolo, engano: Eis aqui um verdadeiro israelita em quem não há dolo (João
1:47).
Já o nosso Senhor Jesus é o nosso maior e grande exemplo a este nível: O
qual não cometeu pecado, nem na sua boca se achou engano (I Ped.2:22).
Os próximos vícios pecaminosos a serem
deixados pelo novo crente estão no plural.
3.- Fingimentos - Significa hipocrisias. É querer parecer o
que não é. É ser um ator na vida, um mentiroso. São atitudes insinceras como as
máscaras com que as pessoas fingidas e desonestas se apresentam umas às outras.
Foi a maior acusação de Jesus aos fariseus. Vejam o que Deus nos diz: Abominação
ao SENHIR são os perversos de coração, mas os de caminho sincero são o seu
deleite. (Prov.11:20). Job podia dizer de si mesmo: (Pese-me
em balanças fiéis, e saberá Deus a minha sinceridade. (Job 31:6). Não
haja fingimentos em nós.
4.- Invejas - Fala também de ciúme e é descrita como uma das obras
da carne de Gálatas 5:21. É querer ter o que o outro tem, ou invejar o que o
outro é. É cobiça. Isto não é característico de um cristão. O fruto do Espírito
é amor,
alegria, paz, benignidade, mansidão, temperança. Gálatas 5:26 diz: “Não sejamos cobiçosos de
vanglórias, irritando-nos uns aos outros, invejando-nos uns aos outros”.
Tiago 3:15 diz: “Mas, se tendes amarga inveja, e sentimento faccioso em vosso coração, não
vos glorieis, nem mintais contra a verdade. Essa não é a sabedoria que vem do
alto, mas é terrena, animal e diabólica”. Ter inveja mostra
que não estamos satisfeitos com o que Deus nos tem dado. Deixemos, livremo-nos
das invejas.
5.- Todas as Murmurações - São maledicências, difamação, calúnia,
falatório da vida alheia, geralmente fruto das invejas. Pedro ataca agora os
pecados da língua, mas com um significando mais pesado, deixando implícito que
se está a falar mal dos outros. É um pecado que puxa muito.
Vejam que em todos estes pecados estão em
vista as relações sociais e humanas.
Depois de exortar ao abandono destes
vícios, vem agora a preocupação com o novo que deve ocupar o lugar daquilo que
foi abandonado na vida do novo crente.
II. O que devemos desejar – v.2 - Primeiramente,
Pedro introduz uma figura que vai usar para nos ajudar a compreender melhor o
que acontece com os crentes que nasceram de novo, que foram regenerados pela
Palavra. Já viram um bebé a mamar ao peito da sua mãe? O bebé alimenta-se do
seu leite como se a sua vida dependesse do mesmo; e é verdade.
Tendo nascido de novo, os crentes são como
meninos
novamente nascidos. Como os bebés anseiam pelo leite materno, assim os
renascidos espiritualmente devem desejar com ardor, afetuosamente, o leite racional. Vejam
a intensidade. Vejam o objeto do desejo ardente, o leite.
Pedro não está a dizer aqui que aqueles
crentes eram crentes recentes e que ainda era bebés espirituais. O que ele quer
salientar é que, sem importar o seu estado espiritual presente, nem o tempo que
já conhecem a Jesus, todos precisamos de crescer espiritualmente. E isso é
feito como? Pela Palavra de Deus. É preciso anelar, é necessário ter sempre um
desejo afetuoso pela Palavra de Deus para crescer, tal como uma criança
recém-nascida anseia pelo leite da sua mãe.
O leite é aqui uma figura da Palavra de
Deus, tema dos vs. anteriores, 1:23-25. O leite é usado como sinónimo de todo o
alimento espiritual do qual todos os cristãos se devem alimentar até ao fim das
suas vidas. Em I Tes. 2:7, Paulo interpreta o seu trabalho jutos dos
tessalonicenses na figura de uma ama que amamenta os seus filhos.
Mas há aqui dois importantes adjetivos que
caracterizam este leite: é racional, ou espiritual. Também é não
falsificado, ou genuíno, puro, isento de mentira, o
contrário de engano do v.1.
Temos um desejo intenso pela Palavra de
Deus? Alimentamo-nos dela diariamente?
Esta atitude constante levará a um
objetivo concreto: para que...
Reparem a sequência lógica do pensamento
de Pedro: Deixando… Desejai… para que…
…por ele, pelo leite
espiritual da Palavra vades
crescendo. O alvo de todo o
crente é a maturidade, o crescimento espiritual. Pedro considera que todos os
crentes, quer recentes quer mais antigos, fortes ou fracos, a precisarem
urgente e constantemente do leite da Palavra de Deus.
Nenhum crente alguma vez ficará tão
avançado e forte em termos espirituais, que não precise mais do leite
racional. Ninguém jamais atinge uma tão elevada espiritualidade que não
possa ser como um mero bebé a desejar afectuosamente a Palavra de
Deus para continuar a crescer até à maturidade. É a Palavra que nos alimenta,
nutre a nossa alma, nos conforta, nos anima, nos dá esperança continuada e
confiança no nosso Senhor e Salvador.
No v.3, por fim, a concluir a ideia
iniciada no v.1, Pedro afirma que é o Senhor a verdadeira fonte do alimento
espiritual: Se é que já provastes que o Senhor é bom.
O pano de fundo é o Salmo 34:8: Provai
e vede que o SENHOR é bom.
O que Pedro está a fazer é a lembrar
aqueles crentes que estas palavras se aplicam a eles: “Já tendes a experiência de que o Senhor é bom”.
Esta é uma verdade, uma certeza que
atravessa toda a Bíblia. A maior prova da bondade de Deus teve o seu ápice na
vinda ao mundo do Seu Filho. Esta suprema bondade mostrou-se real quando Jesus
agiu indo à cruz em sacrifício de redenção pelos ímpios pecadores perdidos e
condenados. A cruz mostrou as abundantes riquezas da sua graça, pela
sua benignidade para connosco, em Cristo Jesus. (Efés.2:7).
Anteriormente, o leite é a Palavra. Agora,
é o próprio Senhor. O que Pedro quer resumir e ensinar profundamente aqui é que
Quem está aqui em foco é o Senhor Jesus Cristo. Assim como um bebé
recém-nascido fica muito satisfeito com o leite materno, desejando-o afectuosamente, assim
também o filho de Deus já provou, anela pela nutrição
espiritual que encontra em Jesus, buscando-O ferverosamente.
Conclusão - Pedro continua a ensinar-nos das
implicações de se ser um crente nascido de novo pela fé em Jesus, regenerado
pela Palavra de Deus: Santidade de vida, deixar as coisas da velha vida
(v.1); Desejar a Palavra de Deus para crescer (v.2) sabendo que o
Senhor é bom.
Moreira, 22 de Abril de 2018 (17h)